Prometeu e Pandora

9/20/2005

Home, sweet home ou o mito de Sísifo

Comprei um apartamento. Finalmente, depois de anos pensando, contando o dinheiro, imaginando como seria ter o meu canto. Posso, enfim, receber meus amigos, namorados, evitar gente chata, ver conhecidos e desconhecidos sem interferência de ninguém. Posso dormir e acordar à hora que quiser. Posso tomar vinho até a náusea e depois simplesmente me arrastar para a cama. Posso arrumar ou não a casa, ler até tarde, ouvir música a todo o volume, assistir aos filmes que gosto, ficar sem falar por horas a fio. E falar sozinha.
O melhor são as descobertas da vida independente. Descobri, por exemplo, que adoro cozinhar. Tenho me deliciado diante de panelas, molhos, temperos, óleos, vinagres e inúmeras receitas que acabo fazendo do meu jeito e com o que tenho no estoque. Tem saído umas comidas deliciosas. Outras nem tanto. A prova da minha felicidade na cozinha é a cintura que está, digamos, mais abrangente.
Mas, como tudo tem seus problemas, me deparei com algo muito chato. O trabalho não tem fim. E, pior, gosto de pia limpa. Adoro entrar na cozinha e ver a pia sem pratos, garfos e restos de comida. Mas isso raramente acontece.
Vou descrever o ritual: faço a comida, arrumo a mesa com requinte (de pobre), como, descanso, lavo a louça. Aí resolvo tomar um café. Lavo louça. Vou dormir, acordo, descasco uma laranja. Lavo louça. Faço um suco. Copo, espremedor, colher e faca. Lavo louça. Almoço. Aí desanda mesmo e a pia fica cheia. Resultado: lavo louça.
Eu sei que esse papo é chato, mas preciso de apoio. Vendo o apartamento e volto a morar com minha mãe? Desisto de jantares e almoços? Continuo comendo? O que fazer com a pia? Ou melhor, até onde a pia vai me levar?
Ah, Sísifo, finalmente te entendo. Pobre coitado. Mais do que desespero, você deve ter sentido tédio. Um completo, absoluto, obsessivo e insuportável tédio. E muita dor nas costas.


 
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